NUMÉRICO

Um. Dois. Três. Cinco. Seis. Dez. Quinze. Vinte.
Alheio ao mundo ele persiste
Contra minha vontade.
Roendo lentamente...

Dezoito horas para adormecer
Dezoito dias para se arrepender
Dezoito anos sem esquecer
Cinco mil oitocentos e trinta e dois
Trezentos e sessenta segundos depois.

Ainda estou vivo
Somando os números
Persistindo em existir
Livre para ir e vir
Preso ao tempo furtivo.

Dezoito horas, dezoito minutos e dezoito segundos no relógio.
Uma coincidência
Nesta minha existência indefinida?
Com tempo de início acertado
Sem marca final de vida
Apenas tempo, e tempo de tempo temperado
Acrescento oitenta e seis mil e quatrocentos ao passado.

INTERNET

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euwwwvocepontocom
naohawwwsentimentos
sohawwwpretensao
www.cade.comaamizade
queanteswwwnaotinhaidade
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CÁLCULOS

Você aí sentado sem viver
Perdendo seu tempo
Acreditando na cultura
Lendo meus lamentos
Sem ao menos me conhecer

Compartilhando intimidades
D'um desconhecido
Achando tudo estranho
E ao mesmo tempo parecido
Com o que acabaste de viver.
E o universo com todo seu tamanho
São iguais nossas ansiedades.

Talvez saibas quem sou
Viu-me passar na rua apressado
Eu não te vi,
Seja ou não meu amigo
Mesmo que não queira saber, cá estou!
Sim, eu, "Um Fracassado"
Escrevendo, ignorando os seus perigos.

Se fosse este um prelúdio da obra
Diria-te dados biográficos
Então verias que não sou melhor que você
Falta-te apenas um papel para escrever,
Dois ou três gramáticos,
Vida e verso, todos tem que sobra.

Não sou um antigo clacissista
Nem tenho meio século de vida
Quero isto sim e muito mais
Um poeta não serei jamais
Talvez chegue a romancista
Fazendo livros de minhas feridas.

Mas sou um Escritor
Afinal, estás lendo o quê?
Tudo que escrevi noutro tempo
Um pouco de prazer e arrependimento
Partes de mim e de você
Ódio, vida, morte e amor.

Escrevo porque sinto
Ninguém escreve por mim
De tudo que vais ler
Não tente entender,
Talvez nem chegues ao fim
Se ainda estiver aí, quero já agradecer,
Obrigado por tentar!
Absorva o que te é bom
Tente se auto-realizar.

Para me descrever como pessoa
Vai me faltar modéstia na mão
Você que está a ler não ria
Um arrogante fazendo poesia
Falando de amor e solidão
Ou faz graça, ou está à toa.

Em meus cálculos
Vinte páginas são boas
Vinte outras são melhores
Vinte não se decifra
Vinte páginas faltaram.

Sendo leitor de poemas
Encontrarás de outros citações
Não se trata de imitação ou plagiato
Antes que fales, me retrato
Homenagens as grandes composições
Aos artistas e seus fonemas.

Se me achas pobre
Agradeço a franqueza,
Mas sei que não sou
Embora não busque riqueza
Escrevo para que lhe sobre
O amor que se me negou.

Igual a você sei que:
"O mundo é dos que sonham".
Mesmo caindo, levantam
E não se incomodam de viver.

Como todo o louco, li o dicionário
Plantei uma árvore, escrevi um livro
Cavei minha cova e o resto já esqueci.
Agora vivo ao contrário
Da selva de pedra um nativo
Em busca do lugar onde nasci.
Somando os dias que vivi,

Subtraindo os dias em que estive vivo.

VINTE E SEIS

- Meu filho está doente!
- Meu marido está desempregado!
- O cunhado de minha prima perdeu um sobrinho!
Eu que estava contente
Faço cara de interessado:
- É mesmo! - Coitado. - Sim. - Não!
Como é engraçado
Por mais que tente
Sigo na contra mão.
Olho o espelho, olhos vermelhos
Sinto a dor, mas não consigo chorar...
A TV, os livros, as músicas, as conversas
Eu não estou dormindo, estou de pé!
Um pensamento entre tantas cabeças
Tento entender, entrar na rotina, ficar calado.
O mundo que passa ao meu redor
já está parado
Ando só, e assim é melhor.
Que morram, que vivam, que sofram
Quem se importa?
Quero mais é dormir...
Abandonar a alma morta
Sem ter para onde ir...

LETRAS VAZIAS

Ó reunião de folhas de papel para uso escolar!
Caderno de páginas brancas
de letras vazias
em que registro minhas confidências.
Quem dera tivesses trancas
como lápides frias
onde jazem meus sentimentos e minhas ciências.
Sem pauta, formato em milímetros, 145 por 220
arame dourado, de uma página leva a seguinte.
E eu debruçado sobre você
a olhar, olhar, olhar e não ver
risco, rabisco e não te entendo.
Guardo-te por enquanto
Da cama, olho-te de canto
Apanho-te, faço um remendo,
um traço aqui, uma palavra ali,
E você imóvel, idiossincrásico
a meus pensamentos
Nossos desejos irmãos entre si,
Eu - de lhe possuir, dominar e entender.
Você - de me reprimir, torturar e enlouquecer.

MATERIAL

Outro dia alguém me falou, por falar
que tudo hoje é descartável
nada é mais constante, durável.
Você consome, e depois some no ar.
Mesmo de madeira, pedra ou metal
Não é como a madeira de anos atrás
Muita tecnologia que em pouco desfaz.
Dê aparência boa e forte, mas no fundo banal.
Parece simplório generalizar assim o mundo,
mas não são só os materiais
é tudo, é a vida, o amor, e mais...
Findam a madeira de lei e o sentimento profundo.
Tudo é superficial, é frio, é trivial
Como um verso raso, sem sentido
Que sujo, deixa o papel descolorido,
E faz da vida um quadro sempre igual.
A vaidade que nos sustém
Numa sociedade podre, decaída,
Que é descartável também
Como uma peça nova a ser adquirida.
Não mais reciclamos
O inútil vai embora
Aí nos enganamos
E o fútil nos devora.

Música

não minta que sente fingindo descente dizendo que não me viu quem nunca mentiu não desista da guerra que a luta encerra no peito que feriu q...